4. Os limites das Capitanias
Conforme anteriormente assinalado, em 1710 foi criado o distrito das
Minas do Ouro, separado da Capitania de São Paulo, sendo os limites
geográficos do sul do território confirmados por reunião de 6 de abril de 1714
na Vila de Nossa Senhora do Ribeirão do Carmo (atual Mariana) - centro da
administração do distrito de Minas do Ouro -, ocasião em se dividiu o mesmo
em três comarcas: Vila Real (atual Sabará), Vila Rica (atual Ouro Preto) e Rio
das Mortes. À Vila de São João Del Rey, desmembrada de Vila Rica em 8 de
dezembro de 1713, foram conservados os mesmos limites entre Vila Rica e a
Vila de Guaratinguetá (que pertencia a Comarca de São Paulo) e mais a criação
da Comarca do Rio das Mortes5 cuja sede era naquela Vila de São João Del
Rey, chamando a atenção das autoridades mineiras a Serra da Mantiqueira como
baliza natural entre as “minas” e São Paulo. À comarca do Rio das Mortes foi
nessa divisão – para a cobrança do quinto do ouro – atribuído o dilatado trecho
da capitania que se estende do “ribeiro das Congonhas, nas divisas da comarca
de Ouro Preto, até a vila de Guaratinguetá pela serra da Mantiqueira, ao sul” não se lhe assinalando a linha do oeste, por se tratar, como explica Diogo de
Vasconcelos, “de sertão desconhecido”.
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Contrariando esse entendimento, a Câmara de Guaratinguetá mandou
fincar um marco de pedra no Morro do Caxambu que era mais ou menos a
metade do caminho entre Guaratinguetá e São João Del Rey, lavrando um auto
de posse em 16 de setembro de 1714. A Câmara de São João Del Rey, nessa
mesma data, mandou arrancar o marco de pedra e levá-lo para o alto da Serra da
Mantiqueira conforme havia sido decretado em reunião de 6 de abril de 1714.
Ali se determinou que o limite sul da Comarca do Rio das Mortes fosse a Serra
da Mantiqueira e a oeste o “sertão desconhecido”, uma vez que, se mantido o
marco como pretendido pelos paulistas, a Capitania das Minas Gerais perderia
terras importantes, que hoje constituem os atuais municípios de Passa Quatro,
Itanhandu, Pouso Alto, São Lourenço e Soledade de Minas.
No ano de 1720 uma incursão na zona mineira da margem esquerda do
rio Sapucaí, por Francisco Martins Lustosa, enseja a que novamente a Câmara
de São João Del Rey defenda a jurisdição da comarca do Rio das Mortes,
situação que seria deslindada por Gomes Freire de Andrada em 19 de setembro
de 1749, reconhecendo como jurisdição mineira as terras de ambas as vertentes
do rio Sapucaí.
Debalde as investidas do governo de São Paulo para refazer o limite
entre as capitanias, ampliando, conforme pretendido, o território da comarca de
Guaratinguetá até o morro do Caxambu. Na realidade, pouco avanço houve nas
tratativas da fiel demarcação das terras de São Paulo e de Minas, conhecendose,
através de documentos constantes do Arquivo Público Mineiro e do Mapa da
Capitania das Minas Gerais, de 1788, pertencente ao Arquivo Histórico do
Exército, que foram várias as tentativas da gente paulista em estabelecer seu
direito de posse nas terras que foram desbravando, mesmo estando na jurisdição
das Minas Gerais, embrenhando-se pelo rio Sapucaí, alcançando Itajubá, Pedra
Branca (atual Pedralva), Santa Caterina (atual Natércia), chegando a Campanha,
o que ensejou, inclusive, a nomeação de Bartolomeu Correia Bueno como
superintendente das minas encontradas ao longo do rio Verde.
Assim é que em 1743 Bartolomeu Bueno, em nome do governador de
São Paulo, desrespeitou a jurisdição mineira, procurando estender o governo de
São Paulo a Santo Antônio do Rio Verde (atual Campanha), assim como a
outros núcleos de povoação pertencentes à comarca do Rio das Mortes, sendo
repelidos em 25 de fevereiro de 1743, ocasião em que foi restabelecida a
autoridade da Capitania das Minas Gerais.
Diante de todas essas controvérsias entre os dois governos, através
agora da intervenção dos vereadores das comarcas do Rio das Mortes e de Guaratinguetá, e ocorrendo uma grande leva de mineradores na região sul de
Minas Gerais, deflagrou-se em 1746 um violento conflito entre mineiros e
paulistas na altura da região da Pedra Branca, provocado, por um lado, pela
proibição da arrecadação dos quintos pela intendência da comarca do Rio das
Mortes, e por outro lado, pela expulsão do superintendente Bartolomeu Bueno.
Com a descoberta de ouro a sudeste da estrada que ligava Guaratinguetá a São
João Del Rey, a posse por esse território foi disputada pelos dois governos,
durando pouco a dominação paulista na região da Campanha até as margens do
Sapucay-Guaçu, embora apoiando esse limite da Serra da Mantiqueira até o Rio
Sapucay–Guaçu, até o rio Grande e desse que serviu de limite entre o novo
governo de Goiás em 1748 (provisões de 1747 e 1748).
Tal conflito ensejou decisão real em tornar definitivamente oficial o
limite anteriormente determinado no alto da Mantiqueira, através da já
mencionada intervenção de Gomes Freire de Andrada, então governador da
Capitania do Rio de Janeiro, que trocou a divisa não pelos rios mas pelos
divisores de água entre as bacias do rio Grande e Sapucaí–Guaçu. De igual
sorte, deu instruções ao ouvidor da Comarca do Rio das Mortes para fazer a
demarcação. Este, no entanto, contrariando as instruções de Gomes Freire,
retirou o marco da Mantiqueira para o “Morro do Lopo” próximo a Atibaia.
Em 1748 São Paulo perdeu a sua autonomia ficando sob a jurisdição do
Rio de Janeiro, assim como as Capitanias do Rio Grande e Santa Catarina,
desmembradas do território paulista, em, respectivamente, 1738 e 1740.
Somente em 1765 foi reestabelecida a Capitania de São Paulo, sob o governo de
D. Luiz Antônio de Souza, que reclama a questão do “morro do
Caxambu” como ainda em aberto.
Com a situação criada pelos dois governos, o vice-rei Conde da Cunha
criou uma comissão que através de longa exposição de motivos seria unânime
em que a divisão acompanhasse o “Assentamento de 12 de outubro de 1765”,
ou seja, a divisão pela serra da Mantiqueira e pelo rio Sapucaí–Guaçu até o rio
Grande: que principiassem as divisas do alto da serra da Mantiqueira, onde
estava um marco antigo, e tirando uma linha pelo cume da dita serra até ao
morro do Lopo, e deste ao morro de Mogi-Guaçu, e dele ao rio Grande, onde
principia a capitania de Goiás.
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O plano da divisão não recebeu a sanção do rei, este temendo a
diminuição da arrecadação do ouro para a contribuição das 100 arrobas anuais,
não definiu precisamente as divisas. Os sucessores do governador paulista
mantiveram a situação tal como se encontrava até que com a descoberta de ouro
nos “sertões de Jacuí” e diamantes no vale do ribeirão das Canoas acirrasse a
questão no século XIX, reaparecendo entre Jacuí e a futura Franca, tendo o
“Sertão do Aterrado de Desemboque” (atual Ibiraci) e região, como pivô
central. Era uma região explorada por faiscadores e caçadores dos índios
paulistas e tendo sesmarias ao longo da “picada de Goiás”. Os paulistas
exploraram essa região também habitada pelos índios caiapós e pelos negros
escravos fugidos das Gerais de diversos quilombos, o que levou as autoridades
mineiras a “limpar” aquele sertão dos seus moradores indesejados, inclusive os
“faiscadores” de São Paulo considerados pelos mineiros “vagabundos” “vadios”
e “bandoleiros”, enfim, “pessoas sem lei e sem rei”. Assim, em 1755 as três
comarcas de Minas financiaram uma expedição liderada por Pedro Franco
Quaresma para efetuar a “limpeza” daquele vale do ribeirão das Canoas. Por
isso Minas Gerais alegava a posse desse território e mais a posse da estrada que
ligava Jacuí ao Desemboque (arraial do Rio das Velhas).
Relativamente ainda às questões de limites envolvendo a capitania das
Minas Gerais, diversos foram, inclusive, os conflitos armados existentes ao
longo do século XVIII, conflitos estes que se estenderam para Goiás, Bahia e
Espírito Santo, motivados em grande parte pelos achados de pedras preciosas
nas Minas Novas (região do rio Fanado). Somente na segunda metade do século
XIX é que surgiria um mapa praticamente definitivo dos lindes do território
mineiro.
Fonte: http://migre.me/wmfNsAlto da Serra - Espaço Colonial de Piquete-SP
a) "alto da Serra da Mantiqueira conforme havia sido decretado em reunião de 6 de abril de 1714. Ali se determinou que o limite sul da Comarca do Rio das Mortes fosse a Serra da Mantiqueira
b) "Com a descoberta de ouro a sudeste da estrada que ligava Guaratinguetá a São João Del Rey,..."