terça-feira, 29 de novembro de 2016

Capistrano e Abreu e a narrativa do Corsário Inglês Anthony Knivet - "Cabe ao leitor saber que partido tomar" ou se trata tão somente de uma questão de visão de mundo eurocentrica de um, em oposição a uma visão quinhentista de outro, no que diz respeito ao El Dorado? (grifos meus)

"A análise de crônicas de viajantes pode impor alguns riscos, como o conflito de datas, quando as ocorrências da viagem podem ser encontradas em outros relatos, o que leva a dúvidas se postas de maneira diferente; a mentalidade, ou seja, quem escreveu o relato, se foi de próprio punho ou ditado; o meio social, com relação à escrita, se procedeu no próprio território de visita, prospecção (neste caso, a colônia portuguesa), ou se foi escrito na Europa. E, se escrito na Europa, outros fatores incidem, como a possibilidade de ser utilizado como instrumento de governabilidade, como será discutido ao longo do artigo. Esses pontos levam os pesquisadores a uma série de questionamentos que não são atuais. No século XIX, com Capistrano de Abreu, há a crítica sobre a veracidade ou não da crônica do marinheiro de Cavendish; já no século XX, Teodoro Sampaio defende um estudo mais aprofundado da narrativa de Knivet, afirmando que a nomenclatura presente na obra não a qualifica como um documento importante para a compreensão da história colonial no final do primeiro século da conquista. 
                                [...] quando assegura ter visto uma sereia, somados a alguns problemas de encadeamento cronológico e de orientação geográfica, entre outras pequenas estranhezas que este texto quinhentista nos traz, fizeram Capistrano de Abreu afirmar que o livro de Knivet é “um misto de observação, de credulidade, quiçá de mendacidade ou apoucada inteligência”. Contra esse juízo, Teodoro Sampaio sustenta que a narrativa de Knivet não foi estudada “por ser tachada de inverídica, confusa ou mentirosa”, uma avaliação injusta, pois segundo ele, Knivet redigiu “um documento de não pequeno valor para a nossa história do primeiro século da conquista”. Cabe ao leitor saber que partido tomar (KNIVET, 2007, p. 24)." (Transcrição) - Fonte: A VIAGEM DO CORSÁRIO INGLÊS ANTHONY KNIVET AO MAR DO SUL E SUA PASSAGEM PELO VALE DO RIO PARAÍBA (1591-1597)1 GIOVANNA LOUISE NUNES* link  http://migre.me/vCmuP

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CONTRAPONTO: Ou seja, não estamos falando de mundos que se cruzam, visto na perspectiva da nova História Cultural. Não podemos afirmar que, o que contrasta,  (visão de mundo), ao mesmo tempo não se complementa. (grifos meus)
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Imagens-de-desenhos-dancando
"O encontro entre culturas diferentes sempre foi marcado por grandes conflitos. Os povos acabam entrando em atrito por tentarem impor aos oponentes a sua forma muito específica e peculiar de ver o mundo, pouco se importando com o que os outros pensam a respeito dos mesmos assuntos. Quando a relação é temperada por ingredientes que tornam o encontro ainda mais "caliente", como minérios valiosos, terras férteis e religião, podem ter certeza que as coisas ficam ainda mais complicadas.
Se pararmos e pensarmos a respeito da chegada dos europeus na América perceberemos que todos os aspectos ponderados no início do texto estiveram presentes nos contatos que se estabeleceram entre os nativos das Américas e os conquistadores (portugueses, espanhóis, ingleses, franceses ou holandeses). A mentalidade européia do período (séculos XV e XVI) baseava-se principalmente no mercantilismo e, as Américas representavam para os europeus, que estavam envolvidos no processo de expansão marítima, a possibilidade de superar as dificuldades encontradas para o estabelecimento do comércio de especiarias com o Oriente, até então monopolizado por árabes e italianos (no que tange as rotas do Mediterrâneo).
Os europeus tinham sede de conquistas, necessitavam de ouro e prata para rechear os cofres das monarquias recém estabelecidas, diziam querer propagar a fé cristã através de suas caravelas e sonhavam com o surgimento de oportunidades comerciais muito enriquecedoras em seus horizontes.
Os índios americanos viviam próximos da natureza, em muitos casos desprovidos de qualquer senso de posse, distanciados da idéia de que ouro e prata enriqueceriam suas comunidades quando transformados em moedas, cultuando em suas preces o frescor das límpidas águas, o alimento oferecido pelo solo e a enorme variedade de animais que podiam encontrar nas florestas. Diferentes visões do mundo. Propostas ainda mais diversas quanto ao futuro esperado. Os índios vislumbravam o encontro com os deuses e o estabelecimento da paz e da prosperidade. Os europeus desejavam encontrar as cidades de telhados de ouro descritas por Marco Polo em suas anotações sobre as viagens que fez a Cipaio e Cipango (China e Japão), o tão sonhado eldorado. Pensavam ao longo do caminho no que teriam que fazer para derreter tais telhados..." (Transcrição) - Fonte: planeta Cinema na Educação - Caminho para El Dorado - Mundos que se cruzam por João Luís de Almeida Machado é consultor em Educação e Inovação, Doutor e Mestre em Educação, historiador, pesquisador e escritor. link http://migre.me/vCnfw

segunda-feira, 28 de novembro de 2016

Artur de Sá Meneses - (Transcrição)

Diziam ser filho natural e legitimado de João Rodrigues de Sá, moço fidalgo, capitão-mor das naus da Índia, senhor da quinta da Porta do Brandão, governador da fortaleza de Setúbal, que o teve de uma lisboeta Mariana de Sousa, e era neto de Constantino de Sá. Este seu avô Constantino de Sá era filho bastardo de Martim Lourenço de Sá, governador do Ceilão, onde o mataram os chingalas. Moço fidalgo, casara com dom Luísa da Silveira, filha de Duarte de Melo, senhor de Povolide, que morreu na batalha de Alcácer-Quibir. Além de serem pais de João Rodrigues de Sá, acima, tiveram Joana, casada com dom Jorge Mascarenhas, comendador de Mascarenhas e uma outra filha, Margarida de Mendonça, que casou com dom Agostinho Manuel.
Feito moço fidalgo por alvará do rei dom Pedro II em 4 de agosto de 1696 inscrito no Livro 10 de Mercês de dom Pedro II de Portugal folha 135: nele, constava ser "capitão general do Maranhão, do Conselho de Sua Majestade, comendador da Ordem de Cristo, lisboeta, filho natural e legitimado de João Rodrigues de Sá e neto de Constantino de Sá, que foram Moços Fidalgos". Foi governador ou capitão-general do Estado do Maranhão. Capitão de infantaria do Terço de Setúbal, serviu nalgumas armadas: na de Túnis, por exemplo. Foi capitão-mor governador do Maranhão de 1687 a 1690 e depois do Rio de Janeiro.
Governador do Rio, São Paulo e Minas[editar | editar código-fonte]
Em 16 de dezembro de 1695, uma Carta Régia o nomeou governador e capitão-general do Rio de Janeiro, São Paulo e Minas, e lhe ordenou passar aos descobrimentos das minas do sul e executar o que se havia encarregado a Antônio Pais de Sande, praticando com os paulistas beneméritos as mesmas honras e mercês de hábitos e foros de fidalgos da casa, conteúdos na Real instrução que a Secretaria de Estado expedira a Sande.
Sua carta patente tem data de 12 de janeiro de 1697 e foi o primeiro governador com graduação de capitão-general. Uma Carta Régia de 27 de janeiro ordena que tenha 600 mil réis de ajuda de custo por ano, além do seu soldo, para a primeira viagem a Minas Gerais, para examinar pessoalmente os ricos tesouros, toma medidas reputadas oportunas.
Tomou posse do governo das capitanias reunidas do Rio de Janeiro, São Paulo e Minas em 2 de abril de 1697, sucedendo Sebastião de Castro Caldas, sendo governador no Rio até julho de 1702. Confessa sua principal missão num ofício de 20 de maio de 1700: o descobrimento das minas, o que o Rei lhe repetirá em carta de 25 de dezembro de 1700. Tinha a mencionada ordem inicial de passar às minas do Sul para prover à distribuição dos ribeiros e animar e acoroçoar novos descobrimentos de prata ouro. Diz mais o Rei, em Carta Régia a ele dirigida, ter ordenado ao mestre de campo das fortificações Martim Correia Vasques ficar no governo do Rio durante a viagem que lhe fora ordenada para descobrir as minas do sertão. Varnhagen, porém, diz que foi nomeado por carta patente de 12 de janeiro de 1697 tomando posse depois de 2 de julho do mesmo ano, ausentando-se para São Paulo a 15 de outubro e voltando em março de 1699; ausentando-se de novo, para Minas, em maio do mesmo ano e visitando São Paulo, onde se encontrava em 10 de fevereiro de 1700.
Em 20 de maio de 1697, escreveu em carta ao rei dom Pedro II: os mineiros não tinham podido se ocupar da exploração das minas "pela grande fome que experimentarem, que chegou a necessidade a tal extremo que se aproveitaram dos mais imundos animais, e faltando-lhe estes para poderem alimentar a sua vida largaram as minas e fugiram para os matos com os seus escravos a sustentarem-se de frutas agrestes que neles achavam." Opinava ele: "Achavam a terra que dá ouro esterilissima de tudo que é mister para a vida humana".
Escrevendo em 1730 sua "Notícia Prática", códice da Biblioteca de Évora, o padre Diogo Soares e o mestre de campo José Rebelo Perdigão citam os tempos primitivos de Minas. "Direi o que se informou ao primeiro general que, com esta incumbência, passou às Capitanias de São Paulo, de que vim por secretário do seu Governo. Tendo-se feito presente a Sua Majestade o muito alto e poderoso rei D. Pedro II de Portugal, de gloriosa memória, de que para estes sertões tinham vindo os primeiros descobridores do ouro, foi o mesmo senhor servido mandar a Artur de Sá e Menezes às capitanias de São Paulo para lhes por em arrecadação e dar as primeiras normas precisas ao aumento de sua Real Fazenda; o que com efeito fez, indo primeiro a São Paulo, onde se informou dos homens e sertanistas mais praticos e fidedignos do principio que tiveram estas Minas, o sítio em que se acharam, e com as suas informações formou o Regimento que fundamos nesta Capitania com a experiência do que vimos e experimentamos nessas Minas, e é o mesmo que hoje se conserva, nelas remetendo-se primeiro ao Conselho e ao Desembargador José Vaz Pinto, primeiro Superintendente das Minas. Pelas notícias que deram em São Paulo os primeiros sertanistas que vieram do descobrimento das esmeraldas com o capitão-mor Fernão Dias e principalmente por um Duarte Nunes, que fazendo experiência em um certo ribeirão disse que desaguava no rio Guarapiranga, de que com uma bateia tirava ouro e tanto que chegava em povoado a fazer dele varias peças lavradas para uso de sua casa, se animaram os moradores de todas aquelas vilas a formarem uma tropa com o intento de buscarem a paragem ou sertão da desejada Casa da Casca, onde diziam, era muito precioso o ouro".
Em 12 de junho, o governador escreveu, do Rio de Janeiro, uma carta ao rei explicando que haveria interesse em que os operários da Casa da Moeda da Bahia fizessem não só moeda de prata, como também de ouro, e que deixassem, em permanência no Rio, operários necessários a tal operação, mesmo quando a fabricação das moedas de prata se acabasse, a fim de constranger os mineiros, particularmente os das jazidas que se diziam riquíssimas de Caeté, a levar seu ouro às oficinas Reais e a ter, assim, quintado - ou seja, recolhido - o quinto, imposto de 1/5 do ouro, depois de catado.
Diz na Carta: "Como tenho conhecido a má fortuna que tem a arrecadação dos Reais quintos de ouro de Vossa Majestade; e os grandes inconvenientes que se oferecem para que se possa fazer aquela cobrança que realmente se deve, tanto pelas distâncias dos sertões como pelos vários caminhos que têm os mineiros para se poderem recolher a povoado sem passarem pelas oficinas, e juntamente pela sua ambição, que cegamente os obriga a faltarem ao que é devido à Real Fazenda de Vossa Majestade, e como este negócio é de tantas consequências pelas riquezas dos ribeiros que hoje se tem descoberto no Caité" - (é a primeira menção oficial ao ouro aí já descoberto) "e pelas diversas noticias que vem das sobreditas minas, dizem uniformemente que são de rendimento nunca visto nestas partes, porque fazendo-lhes a êles conta render-lhe cada bandeja da terra um vintém, e sendo dado a cada pessoa 40 bandejas cada dia, em estas minas andam mais de 4 000 pessoas trabalhando, tendo de rendimento ordinário cada bandeja 8 vinténs, e se houvera de dar crédito à variedade das notícias fazem incrivel o excesso de seu rendimento. E dizem que estas minas se dilatam de tal sorte pelo pé de uma serra que faz entender aos mineiros será o ouro naquela parte de muita duração, e como é de tão grande utilidade para os vassalos a riqueza que estas minas produzem e Vossa Majestade tão generosamente lhes concede, e êles, esquecendo-se das suas obrigações, extraviam aquela pequena parte que Vossa Majestade manda reservar para a sua Real Fazenda; e é justo que se busque todo o remédio para que a ela se pague o que cada um dever; e o mais eficaz me parece que na casa da moeda que se há de erigir nesta cidade se bata a do ouro; e ainda que se acabe de fundir a de prata brevemente, fiquem sempre aqueles oficiais que bastarem para bater a de ouro, porque desta sorte todos hão de trazer o ouro aquela parte para o converterem em moeda e de necessidade o hão de quintar, pelo risco de que lho não tomem por perdido na dita casa, e a moeda que se fundir deve ser do mesmo valor que a de Portugal, porque como este género é fruto da mesma terra, possa ter saída para o Reino. E sendo Vossa Majestade servir mandar ponderar este arbitrio, e parecendo-lhe conveniente, se deve de acudir com o remédio para que experimente menor dano a Real Fazenda. Vossa Majestade mandará neste particular como em todos o que mais convier ao seu Real serviço. Deus guarde a Vossa Majestade muitos anos como os seus vassalos desejamos e havemos de mister."
Em São Paulo e em Minas[editar | editar código-fonte]
Deixando Martim Correia Vasques na interinidade, partiu em 16 de outubro de 1697 do Rio de Janeiro para São Paulo com 70 pessoas, retornando em abril de 1698. Foi averiguar sobre as minas, denunciadas no Sul: percorreu numerosas vilas do interior e litoral, avaliando as minas nelas existentes, e ver os elementos tendentes a sua próxima expedição ao Sabaraboçu. Teria sido guiado por Borba Gato, já desta vez? Parece que, em vez de tomar o caminho de Itaverava que o conduziria às minas do Ouro Preto, foi primeiro ao rio das Velhas, assistindo à primeira repartição de terras. A baliza providencial da região, a serra da Piedade, era vista de muitas léguas ao redor. Na época, em São Paulo, enfrentavam-se as desordens do juiz ordinário Pedro de Camargo.
Carta Régia de 27 de novembro de 1697 ordenou a Artur de Sá e Menezes ir à Capitania de Minas Gerais e abrir uma estrada entre as duas capitanias. O governador passou por Taubaté neste mês, rumo às Minas onde já havia tumulto de guerrilhas e flibusteirosnos ribeirões. O turbilhão migratório enveredava pelas gargantas do Mbaú ou Mbaé ("corredor", "garganta de serra").
Outra Carta Régia de 27 de dezembro de 1697 ampliou a jurisdição dos governos do Rio, tornando-os independentes da jurisdição dos governadores gerais na Bahia, submetidos apenas ao Rei. Tudo para facilitar o desempenho da missão de administradores das Minas.
Em 7 de janeiro de 1698, criou, em São Paulo, o primeiro Terço de ordenanças. O comando foi entregue ao coronel da ordenança Domingos de Amores, capaz de auxiliar o provedor das Minas na arrecadação dos quintos. Em 1697, tinha sido dada patente de mestre de campo dos auxiliares da Capitania de São Vicente e mais vilas de serra acima, por Artur de Sá e Meneses, a Domingos da Silva Bueno. Estava, assim, agrupada em dois Terços: um de auxiliares e outro de ordenanças, a população apta ao serviço militar. Dias depois, em 13 de janeiro, há provisão do governador com respeito a José de Camargo Pimentel. Persuadido por intrigas de sua incapacidade, pois o denunciavam como tirano e peculatário, quis nomear Garcia Rodrigues Pais, que andava entretanto a fazer o Caminho Novo para o rio das Mortes; de modo que, em sua ausência, foram nomeados o capitão Antônio Rocha Pimentel e, na de ambos, Diogo Gonçalves Moreira.
Temos um ofício que dirigiu ao Rei em 29 de abril, ainda do Rio, reproduzido em Diogo de Vasconcelos, "História Antiga de Minas Gerais", volume IV, no qual afirma: "Senhor. A conta que Sebastião de Castro Caldas deu a Vossa Majestade das minas de Taubaté, mais de cem 100 léguas, continuamente se vão descobrindo, como já tenho dado conta a Vossa Majestade em carta de maio; o ouro é excelentissimo e dizem os ourives que de 23 quilates; as diligências que achei o sobredito Sebastião de Castro Caldas yinha feito para a boa arrecadação foi ter criado um provedor em Taubaté e uma oficina; e agora fico cuidando se convém ao serviço de Vossa Majestade o conservar aquela oficina, pelas dúvidas que se me oferecem prejudiciais à boa arrecadação dos quintos; porém sobre este particular não tenho disposto nada contra o que Sebastião de Castro Caldas deixou ordenado porque quero ver primeiro o que a experiência me ensina, examinando este negócio maduramente; e nestas Minas tinha provido Sebastião de Castro Caldas um guarda-mor que é o ministro que reparte as datas aos mineiros e que tem o cuidado de cobrar o dinheiro que se dá pela que toca a Vossa Majestade, a qual se põe em praça, e como êste provimento foi sem conhecer o sujeito, o qual era incapaz a tal cargo pelo seu mau procedimento e tiranias que usava, e demais não dando conta nenhuma do que tocava a Vossa Majestade, roubando para si, o mandei depor do ofício e provi nele pessoa benemérita, que entrando pode servir bem a Vossa Majestade e mandei Ordem ao antigo guarda-mor, a quem chamam José de Camargo Pimentel que viesse logo dar conta das datas que pertenciam a Vossa Majestade; como não me tem chegado resposta dessas Ordens, ñ posso dar conta a Vossa Majestade com aquela individualidade que é justo. Vossa Majestade neste particular como nos mais mandará o que mais convier etc. Rio".
Esse péssimo conceito era resultado de informações apaixonadas, como em dezembro de 1699 se verificaria. Estaria, assim, Bartolomeu Bueno de Siqueira ainda entranhado nos matos de Pitangui. José de Camargo Pimentel era amigo de Carlos Pedroso da Silveira. Não se adivinha se teria José partido para seu distrito, mas inutilmente, pois pois a maneira por que corria o ouro nos ribeiros em forma de aluviões e de maneira impedido, que não se podia tirar senão à flor da água e que por extenso todo o leito era cercado de florestas e entupido de penhascos e raízes, não tendo espaço para medições - os mineiros trabalhando em desordem e tumulto, indo e vindo por onde lhes parecia. O guarda-mor se limitara a fiscalizar e exigir os quintos reais, causando, aos exploradores, descontentamento, ficando suspeito dos inimigos. Até 1713, se desvendarão Tripuí, Carmo, Gualacho, Ouro Preto, Paraopeba, Serro do Frio, rio das Velhas, Inficionado, Pitangui, Pará, Itatiaia, Catas Altas, Santa Barbara, Prata, Brumado, Caeté, rio das Mortes etc., que constituíram o grande núcleo das Gerais.
Em 20 de maio de 1698, o governador escreve ao Rei e diz: "É sem dúvida que rendera muito grande quantia, se os mineiros tivessem mineirado este ano, o que não lhes foi possível pela grande fome q experimentaram, que chegou a necessidade a tal extremo que se aproveitaram dos mais imundos animais, e faltando-lhes êstes para poderem alimentar a vida, largaram as minas e fugiram para os matos com os seus escravos a sustentar-se das frutas agrestes que neles achavam; porem este ano há esperanças de que recuperem o que perderam, e pelas noticias que tenho das sobreditas minas, são de grande rendimento e quanto mais entram pelo sertão, dizem que são mais ricas, e a duração delas será para muitos anos; porque em todos aqueles ribeiros e serras, dizem se acha ouro. Estimarei muito que minhas diligências produzissem grandes aumentos à Real Fazenda de Vossa Majestade a quem Deus guarde".
Refere-se aos descobertos de Carmo e de Miguel Garcia, única parte conhecida e explorada. Mas alguns moradores haviam retornado a São Paulo, como Salvador Fernandes Furtado, cuja família morava em Pindamonhangaba, deixando nas minas seu filho Antônio Fernandes, para fazer roça, que escolheu como sítio o Morro Grande, mais tarde Engenho Pequeno. Preocupados com a fome, os habitantes do Carmo se dispersaram e datam desse biênio 1697-1698 as mais antigas fazendas da região do Carmo, dos Gualachos do Norte e do sul. Esta carta de Artur ao Rei figura a "Coleção dos Governadores do Rio", I,VI,117 e Basílio de Magalhães a cita na Revista do Instituto Histórico de São Paulo, volume XVIII, página 333.
Em ofício ao rei em 24 de maio de 1698, diz ele: "Depois de ter adquirido algumas notícias de pedras que podem prometer metais e examinando em todas aquelas e antigas tradições destes negócios, que não podem ser averiguaveis seus mineiros, que o entenda enquanto este não vem vem, parece-me conveniente ao serviço de Vossa Majestade buscar todos os caminhos para que os quintos do ouro de lavagem não se extraviem e continue o aumento das minas. Como as dos Cataguazes são tão ricas, pareceu-me preciso facilitar aquele caminho de sorte que convidasse a facilidade dele aos mineiros de todas as vilas e os do Rio de Janeiro para irem minerar, e poder ser as minas providas de mantimentos, o que tudo redundará em grande utiliade da Fazenda de Vossa Majestade, o que me obrigou a fazer diligências em São Paulo por pessoa que abrisse o caminho do Rio de Janeiro para as Minas e e tendo-se-me oferecido Amador Bueno, eram tão grandes os interesses que me pedia qye o excusei sobre a dita diligência. Sabido êste negócio por Garcia Rodrigues Pais, o descobridor das chamadas esmeraldas, se me veio oferecer com todo o zelo e desinteresse para fazer este, porem não se podia expor a êle sem eu vir ao Rio de Janeiro para o auxiliar; e é sem dúvida que se o dito Garcia Rodrigues consegue o que intenta, fará grande serviço a Vossa Majestade e a este governo grande obra; porque pende o interesse de se aumentar os quintos pela brevidade do caminho; porque por este donde agora vão aos Cataguazes se porá do Rio não menos de três meses e de São Paulo 50 dias; e pelo caminho que se intenta abrir, se porão pouco mais de 15 dias. Agora se consegue a utilidade dos campos gerais, os quais são tão férteis para os gados que dizem estes homens virão a ser outro Buenos Aires. Do Rio a êstes campos são 7 a 8 dias e daí as Minas pouco mais de oito. Também fica facilitado o descobrimento do Sabaraboçu pela vizinhança que fica desta praça."
Agitação em São Paulo, 1698[editar | editar código-fonte]
Em junho de 1698, Sá e Meneses foi por terra a São Paulo, apesar de correr ali fama de que o matariam, por motivo de movimento contrário à lei régia que havia alterado o padrão da moeda. O movimento era chefiado por Pedro Ortiz de Camargo (filho de Fernando de Camargo, o Tigre) e por Bartolomeu Fernandes de Faria contra o partido do governo: este era integrado por Manuel Lopes de Medeiros, Domingos Dias da Silva, e Godói Colaço. Desde novembro de 1697, porém, Artur de Sá e Meneses tinha soldados no campo de Piratininga.
Retorno ao Rio[editar | editar código-fonte]
Em 16 de julho de 1699, reassumiu o governo, entregue desde 15 de outubro de 1697 ao governador interino Martim Correia Vasques. Na sua viagem seguinte, a São Paulo e a Minas, entregou o governo do Rio em 15 de março de 1702 a Francisco de Castro Morais, e o reassumiu em 8 de julho para entregá-lo definitivamente a seu sucessor, dom Álvaro, em 15 de julho de 1702.
Há provisão sua, de 2 de outubro de 1699, relativa ao Caminho Novo, pois quando o esboço da nova estrada entre o Rio de Janeiro e as minas estava traçado, os habitantes do Rio se recusaram a pagar a soma pedida por Garcia Rodrigues Pais, de modo que este recebeu do governador as seguintes concessões: durante dois anos, a partir de 1 de junho de 1700 seria o único a poder fazer circular mercadoria pela estrada e ninguém poderia usar o caminho sem sua autorização expressa. Assegurava que o caminho era "muito capaz para condução de gado e cavalgaduras carregadas" e que graças a ele, bastariam 14 dias entre o Rio e as Minas. Além do mais, a Carta Régia de 19 de abril de 1702 o nomeou Guarda-Mor Geral das Minas.
Em 1700, o governador dividiu o enorme território que percebia ser o das minas em Minas de Cataguazes e Repartição do Rio das Velhas. Em 10 de fevereiro de 1700, o capitão-general mandou, para as Minas, um paulista, sargento-mor Manuel Lopes de Medeiros, para repartir as datas, e, na portaria, escreveu: "Por algumas notícias que me tem chegado do sertão, dde que nas minas tem havido algumas desordens, todas prejudiciais ao serviço de Sua Majestade, que Deus guarde e ao bem comum dos que habitam aquele lugar; por ser mui conveniente atalhar semelhantes perturbações e juntamente dar forma à repartição dos Ribeiros porque da confusão de não haver forma neste negócio nascem desordens com bandos de parte a parte e como este particular é de tanta consideração, me precisa a buscar-lhe remédio pronto, e para este respeito ser eficaz carece de pessoa de atividade e respeito, o que tudo ocorre na pessoa do Sargento-Mor Manoel Lopes de Medeiros e ao qual ordeno vá às Minas dos Cataguazes e seu distrito a repartir as datas dos Ribeiros descobertos, e que se descobrirem, conformando-se com o Regimento que lhe mandei passar em 4 de fevereiro presente, dando-o à execução inviolàvelmente, e examinará em companhia do Capitão João Carvalho da Silva Aguiar as Minas que suspeitam ser de prata, ou de outros quaisquer metais de que tiver notícias, e de tudo me dará conta para eu a dar a Sua Majestade que Deus guarde", e mais.
Estando em São Paulo em 18 de fevereiro de 1700, Artur de Sá e Menezes nomeou ainda Domingos Amores de Almeida, mestre de campo do Terço de ordenança para ficar na guarnição da vila e também Domingos da Silva Bueno, mestre de campo dos auxiliares, e ajudante dos auxiliares deste Matias Barbosa da Silva, a fim de o acompanharem na projetada visita aos Cataguases na segunda metade do ano. Já em 23 de fevereiro, na ausência de Garcia Rodrigues Pais, o capitão-general nomeou este mesmo Manuel Lopes de Medeiros "Guarda-mor das Minas dos Cataguazes até os limites do Sumidouro em que assiste o tenente-general Manuel Borba Gato". Separação, portanto, das Minas dos Cataguazes e do Rio das Velhas. Medeiros recebeu também a incumbência de examinar, com João Carvalho da Silva Aguiar certas minas que se diziam de prata naquele distrito de Minas. Em novembro, porém, regressará doente a São Paulo.
Datado de 26 de março de 1700, outro bando do Governador proibiu que fossem transportados para as Minas escravos de cana e mandioca, enquanto ao mesmo tempo a Câmara se dirigia ao Conselho Ultramarino e pedia providências para facilitar a entrada de africanos. Conseguiu duas medidas: a instituição de um tributo de 4$500 por cada escravo tirado de engenhos e despachado para as Minas (desde Carta Real de 10 de junho de 1699, havia direitos de entrada de 3$500 para cada negro vindo da África para o Rio) e a liberdade de comércio de negros e tráfico. A própria Coroa traficava: e desde a Carta Régia de 16 de novembro de 1697, o preço de cada negro vendido era 160$000; em 1718, o preço tinha subido a 300$000, embora o custo fosse de apenas 94$000.
Em São Paulo, o povo levantava-se inquieto com a enorme afluência de gente para as Minas. Aproveitando sua presença ali, em 16 de abril de 1700 uma reclamação da Câmara de São Paulo lhe foi entregue como governador da Repartição do Sul, assinada por Garcia Rodrigues Pais, dom Simão de Toledo Piza, José de Camargo Ortiz, Manuel da Costa Leme, Antônio Prado da Cunha e Pedro Taques de Almeida (não consta Amador Bueno da Veiga, que estaria talvez no sertão). O povo se reuniu na casa do Conselho para requerer dos oficiais da câmara solicitar de Artur de Sá e Menezes fazer presente a Sua Majestade: "as terras do território das minas de Cataguazes assim como os matos lavradios, de direito pertencem aos Paulistas, para as possuirem por datas de Sua Majestade ou do donatário, porquanto eles foram os que as conquistaram e descobriram as minas de ouro que atualmente se lavram, o que tudo fizeram à custa de suas vidas e fazendas, sem dispêndio algum da Fazenda Real e que seria grande injustiça concederem-se ditas terras aos moradores de fora." Pretendiam que tal reclamação se fundava na Carta Régia de 18 de março de 1694 acerca de favores e mercês concedidos aos que descobrissem jazidas de ouro e prata. O que revela já a rivalidade entre Paulistas e Reinóis que originará a Guerra dos Emboabas (1707-1709). Plenamente justificado o procedimento dos paulistas, posteriormente, no Rio das Mortes. Mas como chamar à razão um governo absoluto? Era impossível.
O grande historiador de Minas, Diogo de Vasconcelos, comenta: "Tentou-se portanto obter o dados oficiais, mas doravante cada vez mais deficientes, a quantidade de ouro extraída sobre a qual incidiram os impostos atingiu 41.000 arrobas ou 615 mil quilos, não se podendo contar o ouro extraido e que apesar da feroz vigilância passou por contrabando. E eram grosseiros e primitivos os processos empregados na exploração das minas. No tempo colonial o ouro valeu entre 1$200 e 1$500 a oitava, e por esse preço baixo a importância de tais arrobas sobe a 250,000:000$000 do tempo."
No Ribeirão do Carmo, o governador nomeou, como guarda-mor da zona, na ausência do capitão Manuel Lopes Medeiros, o mestre de campo Domingos da Silva Bueno, encarregado de repartir terras e águas e manter a paz. Nomeou ainda superintendente e administrador geral o Desembargador José Vaz Pinto, cargo que este ocupará até 1704-1705, mas como estava ausente ainda, deixou o tenente-general Borba Gato com a jurisdição da repartição do Poente e o mestre-d-campo Domingos Bueno com idêntica jurisdição no Nascente do rio das Velhas, isto é, Carmo e Ouro Preto.
Em 25 de fevereiro de 1702, o governador Artur chegou ao Arraial de Sabarabuçu. Esteve em diferentes pontos do rio das Velhas em maio, junho e julho de 1702, mesmo em 18 de julho, quando seu sucessor, dom Álvaro da Silveira e Albuquerque, já tinha entrado em funções no Rio e fora nomeado um superintendente das Minas, José de Vaz Pinto. Tais longas estadas nas Minas permitiram ao Governador estabelecer a ordem, apaziguar discórdias e estabelecer a estrutura administrativa. Como Antonil fala da sua "grande fortuna" é provável que se tenha entregue à mineração por sua própria conta!
Antes de partir, em junho de 1702, fez publicar um novo bando em que dizia (reproduzo palavras de Diogo de Vasconcelos):
"Porque Sua Majestade, a quem Deus guarde, foi servido mandar por sua Real Ordem proibir todo o comércio do sertão da Bahia para este e deste para a Bahia, por assim convir a seu Real serviço, e por que dos sertões da Bahia e Pernambuco tem vindo algumas pessoas pouco observantes desta ordem e se acham nas Minas, ordeno e mando que toda pessoa de qualquer qualidade, estado ou condição que seja, dentro do termo de quatro dias sejam despejados sobre as ditas Minas pelo caminho do Rio de Janeiro com a pena de 10 mil cruzados pagos da cadeia e três anos de degredo para a Nova Colônia; e outrossim as pessoas existentes nas Minas, de uma e outra repartição" (faz referência às minas do Rio das Velhas, as do Carmo e Ouro Preto, que eram regiões administrativamente distintas) "que pois tratar com alguns dos sobretidos em Fazenda de qualquer gênero e valor que seja, vindo da parte da Bahia, encorrerão no valor tres dobro em que for avaliada a dita fazenda, da mesma sorte que o vendedor, o que tudo será para a Fazenda Real. E ordeno aos oficiais da Guerra, Fazenda e Justiça façam dar execução a este bando inviolavelmente e do contrário ficam inabilitados de todos os despachos e honras que Sua Majestade poderia fazer, e perderão os postos e ofícios que tiveram. E para que chegue ao conhecimento de todos se publicará este ao toque de caixa."
E comenta o historiador: "Artur de Sá e Menezes, que tanto incentivara os caminhos do sertão e o povoamento, via-se na angustiosa alternativa de obedecer as ordens do Rei ou de ser incoerente, e tomara a resolução evasiva de publicar as ordens régias somente na véspera de sua retirada das Minas, com o que nem se comprometeu aos olhos do povo nem se arriscou a chegar ao Rei acusado de omisso. Um ato de última hora no Sabará, pois a Ordem de 9 de dezembro deve ter-lhe chegado às mãos em abril... Evidência de uma reviravolta na política da Corte, que, em vez de canalizar e dirigir com proveito o curso dos acontecimentos, tentava ineptamente paralisá-los em país governado a duas mil léguas de distância!"
Retorno a Portugal
Voltando a Portugal, foi governador da praça de Abrantes com o posto de sargento-mor de batalhas, esteve quase sempre doente e morreu em fins de janeiro de 1709. Não casou, mas deixou, por universal herdeiro, dom Rodrigo Anes de Sá, Marquês de Fontes. Deixou uma filha bastarda freira na Foz, que ficou com oito mil cruzados do trespasse do seu morgado. Teve grande tino político na missão de descobrir e fiscalizar as opulências minerais do solo do Brasil - "de onde veio muito rico", segundo conta o nobiliário de dom Antônio de Lima Pereira.
Fonte: Origem: Wikipédia, a enciclopédia livre. http://migre.me/vBPj4

Famílias dos sertões da Mantiqueira por Mônica Ribeiro de Oliveira

 A ocupação dos sertões da Mantiqueira - As proibições de trânsito e fixação de grupos e indivíduos eram, portanto, ineficazes. Nos sertões da Mantiqueira encontramos no livro de lançamento de escravos de 1715, para o procedimento da capitação para os denominados “moradores da Ibitipoca”, a presença de 30 proprietários com uma posse total de 149 cativos.6 Esses dados comprovam, já nas primeiras décadas da extração aurífera, propriedades de diferentes dimensões, voltadas não só à extração do ouro de aluvião como também às atividades agropastoris.7 Mas é a partir dos meados do século XVIII que a região foi efetivamente ocupada. Centenas de sesmarias foram doadas entre as décadas de 1740 a 1770, sendo incentivada com isso a abertura de picadas e trilhas entre as propriedades e dessas com os principais canais de escoamento da produção, por mais que bandos8 fossem publicados para conter a ocupação descontrolada. A motivação das proibições não era outra senão o controle da cobrança de quintos, mas, caso o ouro não fosse encontrado, nada podia ser confiscado, o que acabava por relaxar o controle e facilitar uma ocupação mais ostensiva.9 Em janeiro de 1756, nas notícias enviadas ao governador pelo capitão Manuel Lopes de Oliveira, constavam informações sobre a abertura de picadas na Freguesia da Borda do Campo, nos chamados “matos gerais do Rio de Janeiro”. Junto aos demais proprietários, o citado capitão empreendia uma política de expansão de terras na região.10 A autonomia desse potentado era garantida por sua rede de parentes amigos, além de seus escravos armados. O difícil estabelecimento de uma autoridade régia, contraditoriamente, enfrentava a ação de indivíduos como esse, mas, por outro lado, servia-se deles para fazer-se presente em áreas mais distantes. Nos assentos de batismos do povoado de Ibertioga encontramos registros de nascimento de dois dos filhos de Manuel Lopes de Oliveira. O capitão era originário da Freguesia de São Pedro Couto de Pedroso, do Bispado do Porto, e era casado com a fluminense Ana Maria dos Santos.11 Sua filha Maria Ignácia, nascida em  1744, casar-se-ia mais tarde com José Aires Gomes, sucessor de seu sogro no controle das terras e dos novos descobertos e que, futuramente, se tornaria uma importante figura da Inconfidência mineira, condenado ao exílio e falecido em Angola. Filhas representavam, acima de tudo, uma oportunidade para realização de boas relações interpessoais. Como padrinho por procuração da filha Maria Ignácia, encontramos o contratador de tributos de entrada e negociante de Vila Rica Domingos Ferreira da Veiga.12 As relações consanguíneas e rituais das redes relacionais do reduzido grupo de homens ricos da localidade se reproduziam, ultrapassavam as fronteiras geográficas e reforçavam os privilégios daqueles que se distinguiam na América portuguesa. Manoel Lopes de Oliveira era um típico representante do grupo de portugueses que emigrou para o alto da Borda do Campo nos meados do século XVIII. Nos assentos de batismos relativos àquela região, desde o primeiro registro em 1708 até o último coletado para 1850, constatamos a presença de 524 pais de origem portuguesa declarada e quase 100% deles entre 1740 e 1770, o que revela ser este o período de pico da ocupação da região.13 Esse grupo fazia parte do movimento populacional de chegada de portugueses provenientes da região do Minho, noroeste de Portugal, especialmente do arcebispado de Braga e Viana do Castelo (Termos de Barcelos, Guimarães, e suas diversas pequenas freguesias) e também dos arquipélagos dos Açores e Madeira. Apesar do fluxo constante de imigrantes portugueses para a região das Minas, o número encontrado na Borda do Campo surpreendeu-nos. Certamente foram estimulados pelos fatores próprios de dispersão em Portugal e nas ilhas, tais como o empobrecimento e a pressão demográfica vigentes no noroeste português. Mas também os imigrantes foram atraídos pelas vastas possibilidades de acesso a terras minerais, agricultáveis e propícias à criação, disponíveis no centro-sul da América portuguesa, assim como a presença de uma população lusa residente, de primeira ou segunda geração, já entranhada no território. Ademais, a chegada como sesmeiro ou mesmo posseiro numa área pouco controlada pelas autoridades metropolitanas afigurava-se como uma excelente oportunidade para se iniciar uma carreira no além-mar. Pelo exposto até agora, percebemos que as ordens régias proibindo a construção de picadas na região (1720, 1733 e 1750), e mesmo a confirmação do “distrito da Mantiqueira” como área proibida (1755), não surtiram o menor efeito. No mínimo uma dezena de pequenos povoados foi fundada na região durante esse período, circundada por uma extensa área de exploração agrícola, pastoril e mineradora. André F. Rodrigues, ao levantar documentação referente às viagens oficiais e exploratórias na Mantiqueira realizadas pelas autoridades portuguesas com objetivo de constatar a situação de devassamento das áreas e potencialidade da extração mineral, descreve a surpresa de D. Rodrigo José de Meneses com a situação encontrada. Diante do quadro, o governador decidiu repartir legalmente as terras entre os indivíduos sem título formal ou entre aqueles que manifestassem esse interesse. Dessa forma, buscava incorporar populações dispersas e inadimplentes, subordinado-as ao pagamento de tributos.14
Os grupos sociais 
Citamos até agora a presença marcante dos portugueses que para o alto da Borda do Campo emigraram, estimulados pelo livre acesso à terra e lavras de ouro, ausência de uma intensa fiscalização e controle por parte das autoridades. Paralelamente a esse grupo, percebe-se a presença de centenas de “nacionais”, lusos de segunda ou terceira gerações, fluminenses e paulistas provenientes de Parati, Pindamonhangaba e Taubaté. Tornar-se proprietário de terras na Borda do Campo, região próxima às estradas de escoamento  de mercadorias para os mercados mais distantes, representava uma importante oportunidade tanto para os chamados “paulistas” como para portugueses. É importante salientar que, simultaneamente ao processo formal de doação de sesmarias, havia espaço para o intruso, o homem livre pobre disposto a arrendar terras para a produção agropastoril, ou mesmo um assento para sua família com pequena roça de milho e feijão. A documentação levantada por nós referenda esse contexto de expansão da fronteira de ocupação na região. 
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Fonte: Revista do Arquivo Público Mineiro  http://migre.me/vBOfO
Parafraseando: Alto da Serra, Caminho Geral do Sertão, espaço colonial de Piquete-SP, onde se deu a instalação do Registro de Itajubá, lado Paulista. Marmelópolis-MG, lado Mineiro, antiga Soledade de Itajubá, região localizada onde passam  às estradas de escoamento  de mercadorias para os mercados mais distantes, representava uma importante oportunidade tanto para os chamados “paulistas”

sábado, 26 de novembro de 2016

Serra de Jaguamimbaba: Patrimônio - Memória e Identidade - Primeira citação em janeiro de 1555, em carta dos Jesuítas, ao citar a fuga de um Guainas, para junto do seus na referida Serra. (Jaguamimbaba - SP). De iaguara + mimbaba (de mim - esconder) : esconderijo das onças.*

(Transcrição) Parque Estadual Campos do Jordão registra presença de onça-parda em seus campos de altitude. 
O registro foi feito por meio de armadilha fotográfica que faz parte de uma pesquisa científica desenvolvida no parque. Além da onça-parda, 13 outras espécies já foram flagradas pelas câmeras, evidenciando a importância da Unidade de Conservação.
O Parque Estadual Campos do Jordão (PECJ) obteve o registro, por meio de armadilhas fotográficas, de uma onça-parda (Puma concolor) em seus campos de altitude. O registro, feito na última semana, faz parte do projeto “Riqueza e abundância de médios e grandes mamíferos no Parque Estadual de Campos do Jordão”, que está sendo realizado em parceria com o Instituto Florestal.
Onça-Parda é registrada no Parque Estadual Campos do Jordão - Foto: Divulgação PECJ


























Onça-Parda é registrada no Parque Estadual Campos do Jordão – Foto: Divulgação PECJ
Segundo a gestora do parque, Camila Oliveira, o registro é um resultado interessante do ponto de vista da conservação. “Já havíamos encontrado evidências da presença de onças, como fezes, pegadas e relatos de vizinhos. Mas as imagens no local onde registramos a onça parda, evidenciam a importância dos campos de altitude do PECJ para conservação de grandes carnívoros ameaçados de extinção. Iniciativas e registros como esses são prioritários para apontar as zonas do parque de maior interesse para a Conservação da mastofauna”, explica Camila.
A importância do monitoramento
A pesquisa científica, desenvolvida pelo PECJ em parceria com o Instituto Florestal (IF), consiste no monitoramento de médios e grandes mamíferos, a partir de armadilhas fotográficas instaladas em diferentes ambientes da Unidade de Conservação, como a floresta ombrófila mista e campos de altitude.Os resultados propiciarão comparações sobre a diversidade de cada ambiente, detecção de espécies raras e/ou ameaçadas, bem como a riqueza e abundância da biodiversidade ao longo do tempo e do espaço, de forma a contribuir com os programas de pesquisa, uso público e fiscalização, apontados no plano de manejo da Unidade.
O projeto teve início em maio deste ano e se estenderá até dezembro de 2017. Desde então, já foram capturadas imagens de 13 espécies nos diferentes ambientes do PECJ, como o veado-catingueiro (Mazama guazoubira); cachorro do mato (Cerdocyon thous); jaguatirica (Leopardus pardalis); queixada (Tayassu pecari) e lobo-guará (Chrysocyon brachyurus).
Sobre a UC - O Parque Estadual Campos do Jordão (PECJ) tem uma área de 8.341 hectares, ocupando um terço da superfície municipal. A UC abriga importante remanescente da Mata Atlântica, com três fisionomias básicas: Mata de Araucária e Podocarpus, os Campos de Altitude e a Mata Nebular. Esses ambientes contam com uma riquíssima fauna, com mais de 186 espécies de aves catalogadas e animais ameaçados de extinção, como a onça-parda, a jaguatirica e o papagaio-de-peito-roxo.
Fonte: Portal do Governo, Fundação Floresta 24/11/16 16:40 http://migre.me/vAMqn
* Dicionário - Tupi Antigo - A Língua Clássica do Brasil, Eduardo de Lameida Navarro, Ed. Global, pág 579

Pateo do Collegio - ".....em direção ao Leste, no Vale do Paraíba, atinge altíssimos picos e muda de denominação para a de Serra da Mantiqueira." (Transcrição)

Por iniciativa de Nóbrega, construiu Anchieta com a ajuda de outros irmãos, do Cacique Tibiriçá e de seu irmão, o Índio Caiubi, uma casa de pau a pique, numa grande colina bem no centro dos Campos de Piratininga (Peixe Seco), a qual serviria como escola, centro catequista e de proteção para os Brasis (Índios), amigos dos Portugueses. Estava fundada a São Paulo de Piratininga em 25 de janeiro de 1554. Posto de observação contra os ataques dos destemidos e heróicos Índios Tupinambás que chegavam pelo Leste, vindos do Vale do Paraíba e Litoral Norte de São Paulo, para lutar contra o invasor Português que violentava e destruía as famílias indígenas Tupinambás, escravizando-as para o trabalho penoso nos engenhos de cana-de-açúcar de São Vicente.
O local onde se edificou o Colégio possuía clima ameno, não tão tórrido quanto o do litoral. Era um posto avançado no interior, em local seguro e defensivo. Baluarte da tranqüilidade para que os irmãos executassem o trabalho junto aos catecúmenos e longe "do barulho", do tráfico de Pau-Brasil, dos portugueses amancebados, das heresias e do canibalismo ritualístico indígena que imperava em todo litoral do Brasil, desde o Norte até as cercanias de Cananéia. Saiba mais aqui e venha conhecer como de fato foi a São Paulo no Século 16 (acerca de 1554)!
São Paulo de Piratininga
Pouca coisa havia naquele lugar, a não ser a Mata Atlântica, nativa e muito exuberante, com muita revoada de pássaros tropicais. Clima ameno no verão, muita garoa ao anoitecer e chuvas constantes. Frio no inverno. Enfim, um clima como o das terras de Espanha, como teria observado Anchieta. São Paulo começou numa grande colina cercada por rios, perfeita como baluarte de defesa: o Rio Tamanduateí (Rio dos Tamanduás) que na época das cheias inundava a área conhecida como Várzea (hoje o Parque Dom Pedro), deixando muito peixe aprisionado nas lagoas que se formavam e por isso mesmo, originando o nome do local, Piratininga: Peixe Seco; o Rio Itororó (atual Avenida 23 de Maio), o Rio Saracura (atual Avenida 9 de Julho) e o Rio e Vale do Anhangabaú (vale do demônio) local temido pois ali habitava o Kaáguara, o morador do mato, o Anhangá. O Colégio ficava ali perto de um despenhadeiro, com vista para o Leste, local de vigilância contra as incursões Tupinambás que chegavam do Litoral Norte e do Vale do Paraíba. Esta colina era de fato um pequeno planalto, constituído de mata densa com alguns caminhos como os do Inhapuambuçu (Rua XV de Novembro) e o Caminho do Sertão (Rua Direita). Eis aí, portanto, a São Paulo do Século 16.
Regiões da São Paulo de Piratininga
Na direção Norte, apenas um caminho (Rua Florêncio de Abreu), localizado depois da cabana de Tibiriçá (Mosteiro de São Bento), o qual conduzia até as proximidades da aldeia do Índio Caiubi, irmão de Tibiriçá (cercanias do Bom Retiro). Dali, uma bela vista de toda a Serra da Cantareira que em direção ao Leste, no Vale do Paraíba, atinge altíssimos picos e muda de denominação para a de Serra da Mantiqueira.
Na direção do Sul, encontrava-se a aldeia do Cacique Tibiriçá nas cercanias do atual Fórum João Mendes Junior, um pouco abaixo, perto do Caminho do Mar (Rua da Glória), muito usado pelos Tupiniquins para subir a Serra assim como também pelos Guaianasesquando iam no inverno pescar nas praias do Litoral de Santos e São Vicente; época em que os grandes cardumes fugindo das águas frias em alto mar, procuravam refúgio se aproximando das águas mais quentes da costa. Era nesta época que os Índios pescavam e moqueavam o peixe (assavam na grelha chamada de moquém), triturando o alimento com a farinha de mandioca para que esta mistura se conservasse por muito tempo, trazendo depois este mantimento para o Planalto. A vista em direção ao sul, era de densa floresta, até as colinas onde hoje se situa a Avenida Paulista. Bem mais ao sul pouco se conhecia: teria havido um lago bem grande (no local do atual Parque do Ibirapuera), circundado por muito brejo (Jardim América, Jardim Europa, Jardim Paulista) até se chegar ao Rio Pinheiros e à aldeia do Ibirapuera propriamente dita (pau ou árvore podre), localizada perto da região de Santo Amaro e nas cercanias deste rio, ao Sul. Para o Sudoeste, muitos morros íngremes (região da Av. Paulsita) e logo abaixo ainda muito brejo havia, até se chegar à uma outra aldeia, localizada em Pinheiros, próxima deste rio onde nas margens haviam muitas capivaras, jacarés e caça abundante.
Na direção do Leste, havia uma grande várzea, formada pelo Rio Tamanduateí (em Tupi) ou Rio dos Tamanduás, o qual na época das cheias, formando lagoas, deixava o peixe aprisionado, dando assim, origem ao nome do local: Piratininga (paraty/piraty: peixe branco; ningá: seco; pronuncia correta: piratiningá). Era o local de partida para o Vale do Paraíba em direção ao Rio de Janeiro, que sequer havia sido fundado, onde naquele local se encontrava a França Antártica de Villegagnon, com o Forte de Coligny instalado na Ilha que hoje está ligada ao continente, ao lado do Aeroporto Santos Dumont. Para o Oeste, ultrapassando-se o temido vale do anhangá (Anhangabaú), chegava-se até o local que bem mais tarde ficou conhecido como Largo dos Curros (Praça da República) e mais um pouco para frente à uma aldeia, no atual Largo do Arouche.
Índios Locais
Os índios habitantes do local eram os Guaianás (ou Gaianases), da mesma família Tupi, liderados pelo Cacique Tibiriçá e por seu irmão, Caiubi, amigos dos Portugueses. João Ramalho, náufrago ou degredado que Martim Afonso de Souza já encontrou morando entre os índios quando chegou à São Vicente, havia desposado a filha de Tibiriçá, a Índia Bartira (Potira), estabelecendo assim relações de amizade não só com os Guaianases mas como também com os Tupiniquins da Costa de São Vicente. Os índios Guianás ao que tudo indica, não praticavam o canibalismo ritualístico como seus irmãos Tupinambás no Litoral Norte e Tupiniquins no Litoral Sul de São Paulo (de São Vicente e Itanhaém até Cananéia). Ramalho e Bartira geraram muito filhos mamelucos, os quais são a origem dos primeiros Paulistas.
Uma maquete em gesso de 1955, obra de Laurindo Galante, da Escola Técnica Getúlio Vargas (atual FGV), retrata com perfeição como teria sido a Colina Histórica de Piratininga no Século XVI, mostrando as indicações dos locais atuais. Venha conferir, portanto, a São Paulo daquela época em nossas fotos exclusivas e descubra um mundo de novidades!
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 Pateo do Collegio: ".... em direção ao Leste, no Vale do Paraíba, atinge altíssimos picos e muda de denominação para a de Serra da Mantiqueira." Entre outras denominações, Serra de Jaguamimbaba, cujo o Alto da Serra contido no Mapa de 1776, corresponde a espaço colonial de Piquete-SP (grifos meus)

quinta-feira, 24 de novembro de 2016

3 - Os muares na história do tropeirismo no Brasil por Giselle Olivia Mantovani Dal Corno* Odair José Silva dos Santos** Cristina Benedetti***

O território em que hoje se encontra o Estado do Rio Grande do Sul não estava incluído naquele inicialmente destinado à Coroa Portuguesa pelo Tratado de Tordesilhas (1494)3 . Tampouco ficava próximo o suficiente de algum dos dois grandes núcleos do Vice-Reino da Prata, que a Coroa Espanhola fundara na América em 1542: o mais setentrional no Peru e o mais meridional em Buenos Aires (originando, em 1776, o Vice-Reino do Rio da Prata). Assim, o atual território sul-rio-grandense era uma área geográfica sem demarcação precisa, sem fiscalização ou cuidado, e serviu a muitas finalidades, inclusive para abrigar as missões jesuíticas que aqui chegaram em 1549. Buenos Aires criava, à época, muares para dar apoio às minas de prata no Peru, atividade que se valia da mão de obra de indígenas escravizados. Paralelamente, a criação de gado começou ser uma atividade de interesse, pois a exportação do couro, muito apreciado na Europa, era muito rendosa. Os próprios padres jesuítas iniciaram rebanhos de gado vacum, criados soltos na Vacaria do Mar, uma extensa área de terra entre a Lagoa dos Patos e os rios Negro e Jacuí. Isso atraiu a atenção de toda sorte de exploradores, tanto portugueses quanto castelhanos (contrabandistas, ladrões, comerciantes...), o que obrigou os jesuítas a procurar outros campos. Formou-se assim a Vacaria dos Pinhais, espalhando-se pelo planalto e pelos campos de cima da serra. Como isso interessasse aos portugueses, Domingos de Filgueiras abriu um caminho na costa para levar o gado desde a Colônia de Sacramento até Laguna, onde era embarcado. Esse itinerário ficou conhecido como o Caminho da Praia, em descrição datada de 1703, e foi alterado parcialmente por Souza Farias entre 1727 e 1730: o trajeto final abandonava a costa à altura do Morro dos Conventos e, subindo a serra, alcançava os “campos das Lagens”, rumando daí a Curitiba e depois a Sorocaba, onde se instalara a grande feira de animais. O tropeiro Cristóvão Pereira de Abreu pensou num caminho melhor, enveredando, em 1732, da costa para o continente na altura de Viamão (Santo Antônio da Patrulha – RS), numa jornada pioneira, em que se uniu “a outros tropeiros, reuniu 3 mil cavalos e mulas, contratou 130 peões e partiu para São Paulo e Minas Gerais, conduzindo a primeira tropa registrada na história da colônia” (RIBEIRO, 2006, p. 142), chegando ao fim da jornada por volta de 1735. Essa iniciativa veio justamente ao encontro da grande necessidade por animais de tração suscitada com o início do ciclo da mineração no Brasil:
 A região das minas não tinha estrutura para receber a grande leva de pessoas, que se dirigiam para lá. Faltava casa, comida e, sobretudo, meios de transporte. Os terrenos não eram muito propícios para a agricultura nas regiões das Minas, além de serem pedregosos, eram muito íngremes. O transporte a cavalo não era um bom negócio porque este tipo de animal não suportava as dificuldades de caminhos inóspitos, falta de água. A princípio, o transporte era feito por escravos, indígenas e africanos. Os indivíduos que para lá se dirigiam não estavam interessados na agricultura, e sim no ouro. Muitas foram as pessoas que morreram de fome, por inanição. (PAES, 2001, p. 59)
Este foi, enfim, o fator decisivo para o aumento do ingresso de muares pela província de São Pedro do Rio Grande, “importados da Espanha ou das colônias hispano-americanas”, onde já havia uma experiência positiva de utilização deste animal em colônias espanholas de mineração como Potosí (PAES, 2001, p. 59-60). Em breve se estabeleceram criatórios de mulas, o que resultou em certo conflito:
O crescente comércio desse animal se deu do Sul para as outras regiões da colônia e a importação concorreu com os criadores de cavalo da colônia brasileira. Diante dessa situação, os criadores de cavalo de fazendas do sertão da Bahia, Pernambuco e Piauí vão reclamar junto a Coroa, a qual resolve proibir não só a expansão da utilização de muares como a existência do animal nestas regiões, conforme Carta Régia de 19 de junho de 1761. (PAES, 2001, p. 60)
A proibição, porém, não durou mais que três anos. Reconhecendo o valor e a necessidade desses animais, a Coroa Portuguesa estabeleceu algumas condições, mas permitiu na Carta Régia de 02 de Dezembro de 1764 a retomada da criação de mulas no sul e no centrooeste. Em Minas Gerais, na Bahia e em outros estados do nordeste brasileiro, a ausência de bons locais para invernada dificultou a criação de muares, que só veio a se intensificar com o  aperfeiçoamento de técnicas específicas no final do século XIX, o que colaborou para suprir as necessidades sempre crescentes do mercado, como se pode verificar a seguir:
No século XIX, as tropas já faziam parte do cenário histórico e a sua importância não diminuiu com o declínio da exploração aurífera de Minas Gerais. Muito pelo contrario, as tropas continuaram responsáveis pelo transporte de mercadorias e de mão de obra escrava, para locais onde não existiam vias fluviais navegáveis nem a presença de estradas-de-ferro. Com a chegada da Família Real Portuguesa e com a política de abertura dos portos, houve o aumento da produção de açúcar, algodão e café. Os tropeiros tinham muito que caminhar, levando e trazendo mercadorias e informações, fazendo transporte comercial, ou vendendo animais, de um ponto a outro do Brasil. (PAES, 2001, p 66)
De modo geral, nos estados do sul havia uma preferência pela utilização da mula, enquanto que, de Minas Gerais para o norte, o burro parece, até hoje, ser a melhor opção. De qualquer modo, é um tema que convive com a própria formação do Brasil, como exemplificado neste comentário de Sathler (2003, p. 20): “Falar em tropa e tropeiros é falar da história de Minas Gerais e do Brasil que, em muitos momentos, é uma só.” É ainda Sathler (2003 p. 21) que comenta: “Muito do que sabemos sobre os tropeiros e do modo viajante da época nos foi narrado pelos naturalistas europeus: os cronistas do século XIX.” O comentário corrobora a ideia de que esse é um tema ainda pouco abordado pela historiografia brasileira, embora a atividade tropeira tenha sido de grande importância para o surgimento e o desenvolvimento econômico de muitas cidades ao longo dos caminhos por onde seguiam as tropas. Este talvez seja um dos motivos pelos quais sejam ainda frequentemente encontradas na linguagem cotidiana fraseologismos ligados a diferentes situações vivenciadas pelos tropeiros em suas jornadas. Fonseca (2011, p. 3) lembra que criações fraseológicas são “construções permitidas pela língua e absorvidas pela comunidade linguística” e que “é preciso que a comunidade autorize o uso desses fraseologismos e reconheça a base cultural comum para que haja o entendimento”. A revisão dos dados obtidos e as informações disponíveis sobre o fazer tropeiro permitem admitir que existe uma base cultural comum percebida pelas comunidades que tiveram ou ainda têm envolvimento com o tema do tropeirismo. De fato, em publicação que reuniu o fruto de duas pesquisas realizadas em estados emblemáticos para o tropeirismo, Rio Grande do Sul e São Paulo, os historiadores Alves e Oliveira (2012, p. 7) concluíram “que o vai e vem das tropas trouxe e levou usos e costumes de uma região para outra, entre os quais os falares comuns aos gaúchos e paulistas, sofrendo pequenas alterações, mas com o mesmo significado.” É nesse sentido que Dal Corno e Santos (2014), ao analisarem EIC que têm como tema o tropeirismo, propõem: Apesar da amplitude de tempo e espaço envolvida, os tropeiros podem ser considerados um grupo social, já que, em função da constância do ofício, compartilharam hábitos, atividades, rotinas, vestimentas e culinária típicas, além de enraizarem no imaginário social mitos, histórias e ditos que representam sua história e visões de mundo. (DAL CORNO; SANTOS, 2014, p. 110) 
A cultura tropeira tem sido bastante exaltada nos últimos tempos, com eventos que procuram resgatar (ou ressignificar) algumas tradições, e até com a instituição de dias ou semanas comemorativas ao tropeirismo. Em algumas cidades do Rio Grande do Sul e do Paraná, por exemplo, foram erguidos até monumentos para homenagear a mula4, dada a sua importância para o desenvolvimento econômico e social das comunidades ao longo das rotas. O burro e a mula, assim, eram animais presentes no cotidiano do tropeiro, muito mais do que cavalos ou éguas. No sul, além de meio de transporte dos próprios tropeiros, as mulas eram também mercadoria (mulas xucras) e, após o encerramento da feira de Sorocaba em 1897, passaram a ser utilizadas para carregar mercadorias diversas. Isso faz com que Villela (2004, p. 616) problematize: “exaltam-se os tropeiros... mas pouco se referem à figura mais importante desses acontecimentos, sem a qual talvez não tivesse ocorrido o tropeirismo... ou teria sido tudo bem diferente.” Pesquisadores sobre o tropeirismo são unânimes em afirmar que o burro e a mula são os animais mais frequentemente citados na referência às atividades cotidianas do tropeiro. Assim, não seria de se estranhar sua grande popularização na forma de expressões idiomáticas, provérbios e ditados que exploram diversas características desses animais. Pensando nisso, realizou-se, para o presente trabalho, um levantamento de expressões idiomáticas de matriz comparativa – EIC – contendo os zoônimos burro e mula.
Fonte: Teimoso como uma mula e mais carregado que burro de mascate: heranças linguístico-culturais em expressões idiomáticas de matriz comparativa http://migre.me/vzN0V

GUIA DA UNESCO - Una guía para la administración de sitios e itinerarios de memoria.

Ficha 22: Ruta de la libertad (A Rota da Liberdade), São Paulo, Brasil (A Rota da Liberdade), São Paulo, Brasil ■ ANTECEDENTES ■ ANTECED...