quinta-feira, 14 de julho de 2016

As controvertidas minas de São Paulo (1550-1650)* (Transcrição)

Sondáveis interesses
Afonso Sardinha, o moço, residia junto ao rio Pinheiros, em São Paulo e minerava em Jaraguá. Descobriu minas de ferro em Araçoiaba em 1589 e, com seu parceiro, Clemente Alvares, minas de ouro no Jaraguá, Vuturuna (Parnaíba) e Jaguamimbaba (nas proximidades da Serra da Mantiqueira). Sardinha ainda teria construído dois engenhos para fundição de ferro em Araçoiaba, sendo um deles doado ao governador geral do Brasil, D. Francisco de Souza, instalado em São Paulo desde 1599.11 O moço faleceu em 1604, em pleno sertão, e fez correr fama de que deixara em testamento “oitenta mil cruzados de ouro em pó enterrado num botelho de barro” A afirmação foi ironizada por Afonso Taunay, pois segundo ele, depois da conversão aproximada desta quantidade em quilos, Sardinha o moço poderia ser considerado um “Fugger brasileiro”.12 Esta suspeitosa riqueza de Sardinha pode ser considerado apenas mais um dos episódios nebulosos que envolvem o tema das minas na São Paulo dos séculos XVI e XVII. Algumas décadas depois, e após muitas especulações, pedidos e expectativas, as minas de São Paulo ainda pareciam despertar dúvidas. Numa carta de Salvador Correia de Sá e Benevides ao rei, datada de 1654, este falava que, em relação às minas da Capitania de São Vicente, os interessados “as avaliam por mais do que são; e os outros por menos do que mostram”.13 Fazia questão de pontuar que “depois de todas aquelas diligencias feitas com Dom Francisco de Sousa por el rey de Castela e das noticias das particularidades (...) não acabo de persuadir me a que na realidade aja tais minas”. Por fim, recomendava cautela para não alimentar muitas ambições e solicitava o envio de alguém com desinteresse para as demandas minerais, segundo ele, coisa “difícil de conservar entre ouro e prata em terras tão remotas”, ainda mais com “os ânimos daqueles moradores sediciosos e turbulentos; porque é a Rochela do sul a capitania de São Paulo”. Reconhecia que ia contra a opinião de muitos, mas, assim mesmo, acreditava que valeria a pena o esforço. E o esforço da família Sá em relação às tais minas de São Paulo não era novo. Anthony Knivet já havia relatado como participara de uma entrada liderada pelo pai de Benevides, Martim de Sá, em 1599.14 Ademais, o avô, Salvador Correia de Sá, era próximo do governador D. Francisco e heas suas mercês após a sua morte, depois de algumas diligências políticas na corte de Madri.15 Em 1613, Salvador Correia de Sá recebeu as mercês, repassando-as, primeiro, para um dos filhos, Martim de Sá, e, depois, para o outro, Gonçalo de Sá. Segundo Carvalho Franco, Benevides viera de Portugal com o avô e o teria acompanhado a São Paulo, onde ficou parte de sua adolescência, por cerca de cinco anos, fazendo ensaios de metal e recolhendo notícias sobre as tais riquezas minerais. Numa carta do avô de 1616, citada por Carvalho Franco, Salvador Correia alegou que estava averiguando as minas e que havia muito ouro, que a cada dia se descobria mais, mas que os ministros reais teriam empenho em esconder as descobertas, já que atingiam suas jurisdições.16 De fato, Salvador Correia chegou a encarregar o filho Gonçalo de empreender uma devassa na vila para apurar a suspeita de que moradores estavam induzindo testemunhas a relatar que não havia ouro algum.17 As notícias das riquezas sempre se revelaram desencontradas. As suspeitas variavam entre a ideia de riquezas minerais extremadas, desviadas, e a de inexistência de metal, tratando-se de um mito alimentado pelos moradores para arrancar privilégios da Coroa. Seja como for, sobre essa riqueza mineral, da qual Taunay, concordando com Capistrano de Abreu, chegou a afirmar que “muito ogó haveria”, sempre recaiu certa suspeita de traquinagem e malícia por parte dos paulistas, tanto na perspectiva do desvio quanto na da inexistência. Uma população mancomunada para ludibriar autoridades e fiscais, como vislumbrou Gonçalo de Sá.18 As eternas suspeitas e boataria em torno das minas esgotaram a paciência até mesmo dos membros do Conselho de Portugal. Em 1630, diante de uma nova petição sobre as minas, feita por Martim de Sá, seus membros responderam que D. Francisco de Souza “não fez cousa de consideração nem de que resultasse utilidade” e Salvador Correia de Sá “também não fez nada nem apurado com clareza a importância delas”. Portanto, se não era possível “alcançar a verdade e certeza das minas de ouro do Brasil”, melhor negar novas mercês e deixar que os particulares buscassem livremente o ouro, desde que pagassem o quinto. Neste mesmo ano, o tema parece ter voltado com força, já que o vigário Lourenço de Mendonça, que viera de Potosí – e segundo seu memorial “persona mais inteligente em matéria de minas” – também solicitava a mercê para explorar e beneficiar as minas de São Paulo, tudo sob suas custas. Em sua petição, usou um argumento técnico para justificar porque D. Francisco de Souza fracassara e como isso não se repetiria:  Fue pues el dito Dom Francisco a beneficiar las dichas minas y sierras por lavadores y bateas o artesones por el qual modo solamente se cava el oro graúdo y que la vista llega a alcançar y se pierde la maior cantidad que es el menudo y que esta encorporado por la tierra y piedra como es el de las minas de Sarruma del Peru. Para superar o problema, dizia o padre que adotaria o sistema de azougue – uso do mercúrio – utilizado no Peru, e que as minas renderiam mais que as de Potosí. Prometia ainda remediar a monarquia com muitos bens e fazer entrar em Lisboa a mesma riqueza que entrava em Castela. Para seu benefício, pedia somente que pudesse trazer para São Paulo gente de Potosí que soubesse beneficiar o ouro e gente para construir engenhos. Por fim, pedia provisões para os capitães e “justicia” de São Paulo, ordenando que ninguém o impedisse, pois soubera que “algunas veces ho an hecho a hombres que a esto venieron del Peru”.19 Lourenço deixa transparecer que existiria uma grande riqueza mineral, não só mal trabalhada, pela exploração na base da faiscagem, como atravancada pelas autoridades, ou seja, um discurso muito semelhante ao de Salvador Correia de Sá anos antes. Outro documento célebre é a carta de Manuel Juan Morales ao rei, de 1636. Ele relata sua permanência em São Paulo desde pelo menos 1595, e sua carta cumpre bem o papel de denunciar uma série de descalabros, justificando mercês ao próprio missivista, detentor da solução de uma parte dos problemas. O tema dos metais de São Paulo perpassa seu relato, já que o autor era especialista em minério de ferro. Em relação ao ouro, alardeia que quando foi responsável pela arrecadação dos quintos, fez subir de setenta mil maravedis, em 1603, “hasta el dia de oi, que es de 636, a cantidad de três mil y seiscentos cruzados”.20 Queixava-se, contudo, que as autoridades enviadas a São Paulo para coibir abusos, principalmente relacionados ao apresamento de gentios no sertão e aos ataques às reduções jesuíticas, eram subornadas com ouro. Em 1609, o capitão-mor Gonçalo Conqueiro foi destituído do posto e enviado preso à Bahia pelo governador Diogo de Meneses, sob a suspeita de que ele havia escondido ouro não quintado em sua casa.21 Autoridades corrompidas pelo ouro, ciosas de seu poder e abrigadas por uma população turbulenta e insubmissa que praticava toda sorte de impedimentos, roubos e boicotes deitaria frutos no tempo. Já no final do século XVII, em 1692, o governador do Rio de Janeiro, Antonio Paes de Sande, dizia que os paulistas escondiam as verdadeiras informações das minas e teriam sido, inclusive, indiretamente responsáveis pela morte do governador D. Francisco de Souza, que se deu em São Paulo em 1611, já que este teria morrido de desgosto depois das notícias do assassinato de um mineiro que enviara às minas.22 Fossem por iniciativa de alguns indivíduos ou de uma população supostamente irmanada e unida em torno da proteção e disfarce das ditas minas, a visão que parece prevalecer neste século XVII é a de que as riquezas minerais de São Paulo eram reais, mas sempre ludibriadas ou erroneamente beneficiadas pelos paulistas. Por outro lado, não se pode deixar de estranhar as recorrentes investidas da poderosa família Sá em torno das minas e de suas mercês. Além disso, como justificar a longa permanência do governador geral do Brasil motivada por elas? Estes supostos empecilhos colocados pelos moradores de São Paulo poderiam ser parte de uma retórica. O discurso sobre um povo sonegador, que colocava obstáculos ao acesso mineral, bem poderia servir para manter em suspensão as possibilidades minerais, valorizar o esforço, e para mais delas se extrair privilégios. De todo modo, os vínculos entre a riqueza mineral e os privilégios jurisdicionais nos parecem claros. O quanto um servia para justificar o outro é uma questão ainda em aberto.
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Fonte: As controvertidas minas de São Paulo (1550-1650)*  http://www.scielo.br/pdf/vh/v29n51/v29n51a08.pdf




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domingo, 3 de julho de 2016

GEOGRAFIA HISTÓRICA DA OCUPAÇÃO DA ZONA DA MATA MIN EIRA: ACERCA DO MITO DAS “ÁREAS PROIBIDAS” (Transcrição)

II. Os Sertões do Leste como “Área Proibida”
No período colonial existiam vários sertões na Capitania de Minas Gerais. Na percepção dos moradores das vilas de São José e São João Del Rei, os sertões eram os cerrados do alto São  Francisco e as picadas de Goiás. Em Borda do Campo, as escarpas da Mantiqueira. Na Comarca de  Sabará, o médio São Francisco. E na de Vila Rica, as florestas do rio Doce (SOUZA, 1998 apudRODRIGUES, 2003, p.256).  No leste da capitania mineira, onde se insere a atual região da Zona da Mata e parte da do Vale do Rio Doce, as faixas orientais das Comarcas  de Vila Rica e do Rio das Mortes formavam um  espaço genericamente conhecido como  áreas proibidas ou  sertão do leste . Em termos de  localização, abrangia os seguintes conjuntos com suas respectivas divisas: a oeste, próximo à região  mineradora central, encontrava-se a freguesia de Guarapiranga, abarcando o vale do rio Piranga,  limitada a noroeste com os territórios dos distrito s de Ribeirão do Carmo e Vila Rica; ao norte,  evidenciavam-se os Sertões da Casa da Casca e do Cuieté, respectivamente, nos vales dos rios  Casca e Doce, cujos marcos divisórios eram dados pelas Comarcas de Sabará e do Serro Frio; o  lado leste era a parte mais imprecisa, pois estendia-se até os limites litigiosos na divisa entre as  Capitanias de Minas Gerais e Espírito Santo; e o sul era composto pela serra da Mantiqueira, no  vale da bacia do rio Paraíba. No centro da área destacava-se o Sertão do Rio da Pomba e Peixe dos  Índios Cropós e Croatos, no vale do rio Pomba6. O marco temporal de ocupação dos sertões do leste o u da Zona da Mata na literatura em  geral tem sido a segunda metade do século XVIII e,  principalmente, o início do XIX. Castro (1987,  p.41, 43 e 67), por exemplo, relatou que a área referida conservou-se em “estado absolutamente  primitivo, independente e segregado”, até o fim do  Dezoito. Para Mercadante (1973, p.22 e 25), a  Mata era desconhecida até a terceira metade do século XVIII. "Vista do litoral, pareciam-lhe  impenetráveis os sertões”. Apesar da proximidade com a costa, “a ocupação não se fizera”. O  fascínio exercido pelo ouro sobre as pessoas e a inexistência do metal na área, a restrição imposta  pela administração colonial à ocupação de espaços não povoados, com o intuito de combater os  possíveis descaminhos do ouro, a barreira natural formada de matas impenetráveis e de tribos  indígenas e a política do Reino que visava impor a especialização produtiva na extração do ouro  teriam sido os motivos norteadores do povoamento tardio. 
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Fonte: http://www.cedeplar.ufmg.br/seminarios/seminario_diamantina/2010/D10A081.pdf

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